Rio

Viúva de Adriano da Nóbrega presta depoimento visando delação premiada e pretende trazer revelações do submundo da contravenção e do crime organizado

Defesa de Júlia Lotufo diz em habeas corpus que ela teme ser morta por grupos criminosos
Julia Lotufo com Adriano da Nóbrega na Bahia Foto: Reprodução
Julia Lotufo com Adriano da Nóbrega na Bahia Foto: Reprodução

RIO — Júlia Lotufo, viúva do miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega , já está detalhando à polícia as ligações de parte da contravenção com o crime organizado. Por ter sido mulher do ex-capitão do Bope, morto na Bahia, em fevereiro do ano passado, numa união estável de cerca de dois anos, ela acumulou informações e pretende com isso um salvo-conduto para escapar da prisão.

Neste momento, ela está em regime de prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica, mas teme voltar para trás das grades por ter estado à frente dos negócios do miliciano. Acuada e com medo de ser morta, prática comum de grupos criminosos para eliminar desafetos, ela vem pleiteando uma delação premiada em troca de benefícios como o perdão da Justiça.

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A viúva de Adriano responde pelos crimes de organização criminosa e lavagem de dinheiro, na 1ª Vara Criminal Especializada da Capital, em denúncia feita pelo Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio (MPRJ). Há três semanas ela procurou a Polícia Civil na tentativa de contribuir com inquéritos de homicídios — que teriam sido praticados por organizações criminosas ligadas à contravenção — que, há quase 20 anos, estão sem autoria. A informação de que Júlia pretendia uma delação premiada foi publicada no site Metrópoles, nesta quinta-feira.

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Quando ainda estava se defendendo por meio do advogado Délio Lins e Silva, que converteu a prisão preventiva de Júlia em domiciliar, a defesa informou no pedido de habeas corpus que ela estava "amedrontada e temendo por sua vida". O assassinato do braço-direito de Adriano, o sargento da Polícia Militar Luiz Carlos Felipe Martins, o Orelha, executado a tiros em Realengo , no dia 20 de março, trouxe ainda mais certeza à viúva de que poderia ser a bola da vez. Ela chegou a ficar foragida, antes de conseguir o direito à prisão domiciliar. O sargento foi morto dois dias antes de que a Operação Gárgula , montada para prender o grupo de Adriano, fosse desencadeada.

O convívio com Adriano fez com que Júlia se transformasse num arquivo vivo. Seus depoimentos agora estão sendo colhidos pela Coordenadoria de Investigação de Agentes com Foro (Ciaf) da Polícia Civil, com a presença do promotor de justiça do caso, na própria sede do MPRJ. Tudo que a viúva de Adriano declara é gravado. Ela está sendo acompanhada pelo escritório do ex-senador cassado Demóstenes Torres. Para a delação ser aceita, é preciso que haja a homologação pela Justiça do Rio, o que ainda não aconteceu.

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Casamento às pressas

Oito meses depois da morte de Adriano, Júlia se casou com Eduardo Vinicius Giraldes Silva , empresário que já patrocinou os quatro times de futebol do Rio, além de um lutador de MMA. Relatório de Inteligência da PF informa que Giraldes foi condenado a oito anos e três meses de prisão por associação criminosa, falsificação e uso de documento particular, furto mediante fraude e furto qualificado, em primeira instância. O empresário teria dívidas com Adriano.

Júlia e Giraldes se casaram num regime de comunhão total de bens, ou seja, tudo que foi adquirido antes e depois da união pertence aos dois, o que não é comum. O padrão em matrimônios é o regime da comunhão parcial de bens, em que o casal só divide o que constrói junto.

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Investigações da Polícia Civil e do Gaeco apontam que Adriano era chefe da milícias de Rio das Pedras e da Muzema, na Zona Oeste, e ainda comandava um grupo de matadores de aluguel, que era contratado por contraventores e políticos. Adriano chegou a ser investigado pela morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, em 2018, mas a Delegacia de Homicídios da Capital descartou sua participação.

O ex-capitão do Bope também tinha seus tentáculos  na contravenção. Ele seria sócio de Bernardo Bello, ex-marido de Tamara Harouche Garcia Lopes, filha do bicheiro Waldomiro Paes Garcia, o Maninho, morto em 2004.

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