Rio

Mesmo sob investigação, Biotech fechou contrato com prefeitura

Auditoria do TCM identificou desvios de R$ 14,3 milhões em 2013

RIO — Apesar de já estar sob investigação do Ministério Público, e de o Tribunal de Contas do Município (TCM) ter identificado em auditoria indícios de desvios de recursos na administração do Hospital Municipal Pedro II, a Organização Social (OS) Biotech foi escolhida pela Secretaria municipal de Saúde, em março deste ano, para administrar o Hospital Municipal Ronaldo Gazolla. O contrato, com validade de dois anos, previa repasses de R$ 146,8 milhões, dos quais R$ 48,7 milhões já foram pagos, de acordo com o portal Rio Transparente da prefeitura. No Gazolla, em Acari, a Biotech substituiu a empresa GPS Total Saúde, controlada pelo Grupo Pelegrine — o mesmo responsável pela OS —, e que administrava o hospital desde 2007, mas por meio de parceria público-privada (PPP).

INDÍCIOS DE SUPERFATURAMENTO

A escolha sem licitação da Biotech aconteceu quando já corria o prazo para ela apresentar defesa das conclusões de uma auditoria do TCM, que havia identificado desvios de R$ 14,3 milhões na gestão do Pedro II, em Santa Cruz, em 2013. Foram encontrados indícios de superfaturamento ou falta de comprovação de despesas em áreas como fornecimento de material de consumo (R$ 5 milhões) e compra de medicamentos (R$ 2,2 milhões). O secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, justificou a escolha afirmando que, na época do processo seletivo, não havia qualquer impedimento legal para a Biotech disputar o contrato:

— Eles tinham o direito de se defender das acusações. Em maio, consideramos essa etapa encerrada e iniciamos um processo para descredenciar a Biotech. Com a operação policial, a secretaria assumirá, por enquanto, a gestão das unidades.

As investigações do TCM começaram a pedido do deputado Paulo Pinheiro (PSOL), da Comissão de Saúde da Câmara dos Vereadores. Ele critica a falha no controle da prefeitura, que permitiu o credenciamento indevido da OS e o desvio de recursos:

— A Comissão de Qualificação falhou ao não identificar que havia ligações entre a Biotech e o grupo que administrava o Hospital de Acari. A Secretaria de Saúde garante que fiscaliza os contratos e a regularidade dos documentos, mas a Biotech foi contratada sem qualquer questionamento.

O cadastramento da OS estava a cargo da Secretaria da Casa Civil, na época comandada pelo atual secretário executivo de coordenação de Governo, Pedro Paulo Carvalho, pré-candidato à prefeitura do Rio. Em nota, ele afirmou que a comissão fazia a seleção das Organizações Sociais, mas não cabia a ela fiscalizar seus atos ou contratá-las.

RELATÓRIO FINAL É ELABORADO

Segundo o presidente do TCM, Thiers Montebello, a Biotech respondeu a apenas 10% dos questionados feitos pelo tribunal, em relação ao contrato do Pedro II. Ele diz que o relatório final está sendo elaborado por técnicos do órgão e deve ser encaminhado ao plenário para voto, para que a prefeitura exija, ao menos, o ressarcimento dos R$ 14,3 milhões comprovadamente pagos de forma irregular.

Antes do contrato com a prefeitura do Rio, o Grupo Pelegrine já havia administrado o Hospital Pedro II, no fim da década de 1990, quando a unidade ainda era ligada ao estado. O contrato com a empresa GMP foi revogado em 1999, durante o governo de Anthony Garotinho. A relação com a Biotech teve início em 23 de janeiro de 2012. O documento estabelecia que a OS administraria o Hospital Pedro II e também assumiria a gerência da Coordenação Operacional da Emergência Santa Cruz (Core).

O dono da Pelegrine, além de controlar a Biotech, em sociedade com mais três pessoas (Monica Freitas Pereira, Antônio Ribeiro Marinho e Milton de Oliveira), aparece como sócio-administrador de mais três empresas: GMP, Prest Clean Total e o Instituto Bem-Estar e Saúde. Todas as empresas foram visitadas ontem pelos policiais civis.

Veja como eram fraudados os recurso públicos Foto: Editoria de Arte / O Globo
Veja como eram fraudados os recurso públicos Foto: Editoria de Arte / O Globo