Economia Brasília

Com fim do auxílio emergencial e pandemia, país pode ter ‘reversão temporária’ de retomada econômica, diz BC

Ata revela que Copom considerou alta de juros na última reunião, mas taxa foi mantida em 2%
A taxa básica de juros continua em patamar estimulativo da economia Foto: Jorge William / Agência O Globo
A taxa básica de juros continua em patamar estimulativo da economia Foto: Jorge William / Agência O Globo

BRASÍLIA — O Banco Central (BC) vê uma possibilidade de “reversão temporária” da retomada na atividade econômica em 2021, a depender do cenário da pandemia do coronavírus e do efeito do fim do auxílio emergencial na economia.

A informação consta na ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada nesta terça-feira, que também aponta que membros do Comitê consideraram elevar os juros no último encontro.

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O cenário de reversão de retomada foi discutido na reunião que decidiu por manter a taxa básica de juros, a Selic, em 2% . Na avaliação do Copom, que reúne os diretores e o presidente do BC, a economia no fim de 2020 surpreendeu positivamente, mas há ainda muita incerteza sobre o comportamento da atividade econômica, principalmente no primeiro trimestre.

“O Comitê ponderou que os riscos associados tanto à evolução da pandemia como ao esperado arrefecimento dos efeitos dos auxílios emergenciais podem implicar um cenário doméstico caracterizado por mais gradualismo ou até uma reversão temporária da retomada econômica”, diz a ata.

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Além desses fatores, o BC ressaltou que a pouca previsibilidade associada ao "necessário ajuste" nas contas públicas este ano contribui para o aumento na incerteza da retomada econômica.

Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, destaca que os números de atividade econômica apontam para um bom resultado nos últimos meses de 2020, mas ressalta que o país está em um periodo de incerteza.

— O principal ponto é a retirada dos estímulos do auxílio emergencial. A gente está vendo a discussão do Congresso, de volta ou não volta, mas a princípio, o BC trabalha com a ideia de que auxílio se encerrou e isso tem um impacto na atividade.

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A avaliação de uma possível queda no crescimento da economia no início do ano é compartilhada por alguns economistas do mercado financeiro. Depois do resultado da prévia do PIB de crescimento de 0,6% em novembro , uma retração na economia já em janeiro entrou no cenário desses analistas.

As expectativas para o ano, no entanto, ainda são de crescimento positivo. De acordo com o boletim Focus, que reúne as projeções de mercado, o país deve ter crescimento de 3,49% em 2021.

No cenário externo, a avaliação do Comitê é que o surgimento de novas variantes do vírus e um processo de reflação (aumento dos preços por conta da retomada econômica) nos Estados Unidos trazem riscos para países emergentes.

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No entanto, também destaca que “amplos programas de imunização” contra a Covid-19 ao redor do mundo, estímulos fiscais e juros baixos em alguns países desenvolvidos contribuem para o ambiente econômico de economias emergentes como a do Brasil.

Discussão sobre alta dos juros

De acordo com a ata, os membros do Copom discutiram na última reunião se já era o momento de voltar a subir os juros, que está em trajetória de queda desde 2016 e vem sendo mantido em 2% desde setembro de 2020. Alguns questionaram se, diante de uma “normalização” do funcionamento da economia nos últimos meses, já não era hora de reduzir o estímulo à economia.

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No entanto, ao final, a decisão unânime foi de manter a Selic em 2% dado o ambiente de incertezas na economia.

“As próximas divulgações serão muito informativas sobre a evolução da pandemia, da atividade econômica e da política fiscal. Sendo assim, os benefícios de se aguardar essas divulgações para decidir os próximos passos da política monetária se sobrepõem aos custos. Por isso, o Copom julgou apropriado manter, neste momento, o grau extraordinariamente elevado de estímulo monetário”.

Ao manter os juros, o Copom decidiu retirar o forward guidance , um compromisso de manter o patamar da taxa. Segundo o comitê a decisão foi feita porque as projeções de inflação já estão próximas da meta.

Inflação dentro do centro da meta

De acordo com o boletim Focus, a inflação deve finalizar 2021 e 2022 em 3,5%, dentro do centro das metas de 3,75% e 3,5%, respectivamente.

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O BC ressaltou também que essa decisão não significa um aumento automático da taxa básica de juros nas próximas reuniões.

“O Comitê reitera que o fim do forward guidance não implica mecanicamente uma elevação da taxa de juros pois a conjuntura econômica continua a prescrever, neste momento, estímulo extraordinariamente elevado frente às incertezas quanto à evolução da atividade”.

No cenário do banco Inter, os juros vão começar a subir em maio. Segundo ela, um momento de pausa para avaliar o cenário, cheio de incertezas, seria mais apropriado do que uma alta de juros já em março.

— Você tem uma atividade mais forte e inflação mais alta que o esperado em dezembro, mas temos uma mudança no cenário hoje que é o fim de vários outros estímulos que foram dados ao longo de 2020, principalmente fiscal e isso tende a ter um impacto na demanda e na desaceleração da inflação.

Na visão do economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, ainda é cedo para subir os juros. Ele ressalta que há um choque de alta nos preços, principalmente na alimentação em domicílio e commodities.

— De fato, nós estamos falando de uma avaliação nesse aspecto no tocante a inflação divergente do meu entendimento. Essa divergência inclusive me dificulta enxergar um cenário altista para os juros porque nós estamos vivendo um choque inflacionário que é relacionado a commodities, a alimentação, enquanto serviços, bens e indústrias continuam em patamar baixo, que são as partes sensíveis à política monetária.